À ESPERA DELA


Aprumei face nos braços do destino dela,
entregando sina
à brisa duma manhã ruidosa.

- havia terra, água e ar; faltava fogo -

Saí por aí calcando passos
sobre folhas ventadas pelo vento.

- repousaram-me sobre a areia -

Projetei-me sobre águas agitadas pelo tempo,
engenhando trilhos para felicidade auspiciada.

- enxergava-a nua e crua. era espelho n'água -

À meia voz, invoquei mãe-d'água,
requerendo sal nas vestes vestidas por mim.

- evaporariam com o tempo. sobrariam pele, sal... e ela –

Desfrutei frutas paridas
pelo verde veludo dos campos,
sossegando facho à sombra dum coqueiro-pissandó.

- o sol se pôs -

Dispensei sono nesta noite de sonho e vilania,
rogando pele às vistas d'um amor desmesurado.

- ela se compôs -

Faltaram terra, água e ar por todos os cantos;
sobraram corpos engravidados de desejo.

- fez-se fogo entre nós -

Engravetamo-nos eu, ela e a lua cheia.

- molhou-se tudo aos sóis –

Sobraram cheiro, pétalas e poucos espinhos.

(em meu peito, ela se decompôs)


Aperriado, danava a deitar vistas no mundo celestial, desenhando, com esmero, nuvens silenciadas pelo sol. Mas o dia quedou-se inerte às dezoito horas. A noite estava por vir. Despedindo-me das imaginações em forma de nuvens, desejava, agora, a cortesia duma estrela cadente. Mas passava o tempo e nada. Nada de nuvens, nada de estrela cadente. Só sonho e mais nada. Ressentido pelo desprezo celestial, restava-me o consolo do infinito troposférico. Observava detidamente cada facho de luz perdida, mensurando, com exatidão, diâmetro, comprimento e intensidade astrológicos. Media, exaustivamente, cada cisco de luminosidade espacial, tecendo, com galhardia, contas e números na ponta dos dedos. Acreditava, cegamente, que nos astros os sonhos se amoldavam, se realizavam, bastando, para tanto, encaixá-los em sua respectiva luminosidade. Mas os números me entristeciam... (era o destino de toda conta popular). Sonhos eram inexatos; estrelas e números, não. Sonhos precisavam de estrelas; estrelas e números, não. E a lua, enquanto isso, solidária com os pedidos carentes de estrela, enchia-se de sonhos desestrelados... (enchia, crescia, minguava, enchia). Renascia periodicamente cheia. Fazia-se cheia. Fazia-se medida de todo sonho. E todo sonho se fazia real, mesmo que espiritual, abrindo vaga para novos sonhos. Era noite de lua cheia. Era noite de realização, de lual. Era sonho lunar. E cabia a mim, pisciano que sou, sonhar, sonhar, sonhar... à espera da próxima lua cheia. Ou, quem sabe, por uma vaga na próxima constelação...

Filhas da Rua


Sorvendo
Segredos
Receios
E anseios infantis
Indagava-se ela
Face ao reluzir das estrelas:

Quem há de cadenciar minhas preces paridas pela terra?

Vinícius


Papéis,
Pincéis
E rimas de boemia.

Tinteiros de paixão,
Vida de poesia.