* pintura: Claude Monet
A chuva sorria aos ouvidos e o cheiro de
terra era forte, galgava todos os cantos.
O quintal era farto, as matas virgens e todos
os sorrisos se faziam gratuitos.
Mesmo com chuva, havia sol.
Crianças corriam feito riso e vô Lilito preparava
com esmero e amor cada uma das brincadeiras
contadas antes de rezar e dormir: era cabra-cega,
pau-de-sebo, corrida de sacos e todas as outras que
se sucediam a cada pedido de querer mais.
Todas as crianças tinham os pés calçados
de lama: felizes, só se fazia sonhar, aproveitar
o tempo dos pássaros e observar formiguinhas destemidas
conversando entre si.
Fazia-se até bolo com areia colorida para todas as pessoas.
Observava-se o dia, todo o calor da tarde e também
o passar a noite, quando o sol descia atrás do pé de mangaba
e a lua lhes observava lá de cima enquanto tomavam sopa de
verduras com café e leite e separavam balas e chicletes
e pirulitos para que ficassem iguais para todo o mundo.
A vó Lêda lhes contava historinhas, penteava os cabelos
e desenrolava todas as guloseimas que só se podia mastigar,
não se podia engolir, era proibido e fazia mal.
Depois era aquela fila para se escovar os dentes
antes de dormir.
Ao fim, todas rezavam e dormiam para mais um dia.
Pediam nada, só agradeciam ao papai do céu pela vó,
pelo vô e por toda a família.
Era tempo sem falta, havia sonhos em demasia
e ninguém sabia ler ou escrever.
Bastava sonhar e todas ganhavam.
Não sabiam de dinheiro, nem de cercas,
nem de muros, nem de vil.
Apenas corriam.
Todas sabiam correr.